Marcelo Barros
No Brasil, no dia 07 de fevereiro, nasceu um grande profeta e no mesmo dia, outro profeta deu a vida pelo povo. De fato, no dia 07 de fevereiro de 1756, no sul do Brasil, perdeu a vida o cacique guarani Sepé Tiaraju, defendendo a terra e a liberdade do seu povo contra os exércitos reunidos de Portugal e Espanha. Sepé Tiaraju era o nome que os índios lhe deram. Significa “facho de luz”. Até hoje, o povo da região o venera com o título de São Sepé, inclusive, nome de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul. No mesmo dia 07 de fevereiro, já no começo do século XX, nasceu no nordeste brasileiro, uma criança que se tornou Dom Hélder Câmara, bispo dos pobres e profeta da justiça e da libertação.
Todo ser humano pode ser um profeta ou profetiza. Há as pessoas que, desde que nascem, desenvolvem este dom. Outros o descobrem no decorrer da vida. Outros/as passam a vida inteira sem acessar essa capacidade que tem nomes diversos conforme a cultura e tradição na qual se desenvolve e que a Bíblia chama de profecia.
Para muitas culturas indígenas, profeta é alguém que interpreta sonhos, se comunica com os espíritos e interpreta o futuro. Na tradição bíblica mais antiga, os profetas eram videntes que, em comunidade, aconselhavam as pessoas sobre o que fazer na vida e previam o destino do povo. Pouco a pouco, descobriram que sua vocação não era tanto a de apenas pressentir o mundo invisível, mas principalmente ser porta-vozes do Espírito para revelar o projeto divino para o mundo. Deus não intervém diretamente na nossa história e respeita ao máximo a autonomia humana. Por isso, para descobrir sua palavra, homens e mulheres que desenvolvem a vocação profética têm de viver uma profunda busca e discernimento da palavra divina que devem reproduzir. E devem ter muito cuidado para não projetar seus desejos e confundir a palavra de Deus com seus próprios discursos e pensamentos. Durante toda a sua vida quem é profeta ou profetiza busca sinais para poder confiar que a sua intuição vem mesmo da inspiração divina.
Há profetas em todas as religiões e mesmo fora das tradições espirituais. Cada profeta recebe de Deus uma profecia própria. Dom Helder viveu a profecia de sempre ajudar a abrir a Igreja Católica para o diálogo com o mundo, o diálogo com as outras igrejas e as mais diversas religiões. Em uma época na qual os padres e bispos eram formados para verem o comunismo ateu como o inimigo número um, Dom Hélder sempre procurou dialogar com os marxistas e aprofundou uma sincera amizade com Roger Garaudy que na época saia do Partido Comunista Francês. Ele via como sua vocação de cristão ser como Jesus, nunca se negar a dialogar com ninguém e, ao contrário, pelos frutos, valorizar a árvore. Isso o levava a se unir a todos os que buscam transformar esse mundo injusto e garantir o direito dos mais pobres. Diferentemente do índio Sepé Tiaraju, porque viveu em outras condições históricas, Dom Hélder sempre optou pela luta não violenta que ele chamou de insurreição evangélica. Aos 89 anos, no Recife, recebeu o famoso Abbé Pierre. Juntos, declararam à imprensa: “Durante toda a nossa vida, lutamos pela justiça e para transformar esse mundo. Agora, no final de nossa vida, percebemos que não conseguimos muita coisa. Mas, nos comprometemos de novo a ir até o último suspiro lutando por essa mesma causa que cremos: Deus confiou a todos nós que cremos nele”.
Os Atos dos Apóstolos mostra que quando o Espírito Santo vem sobre os discípulos de Jesus faz de todas as pessoas que o acolhem, profetas do projeto divino no mundo. Ao celebrar a memória do nascimento do profeta Hélder Câmara e do martírio de Sepé Tiaraju, o importante é prosseguir com sua profecia. Se fizermos isso, então, o mundo será mais feliz porque, todos os dias, nascem profetas.
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