“O pior, Anne, é que já existem leis para se combater tanta crueldade. Mas não existe lei que possa colocar amor dentro do ser humano.”
Lívia Fernanda de Souza Mendes tem 13 anos. Mineira, a garota foi vencedora da edição de 2013 de um concurso nacional que acontece anualmente na Rede de Escolas Anne Frank Brasil. A proposta? Os alunos teriam que escrever uma carta destinada à Anne Frank, a adolescente judia e alemã, vítima dos campos de concentração durante o Holocausto da Segunda Guerra. A carta deveria abordar o tema “Anne Frank e a cultura da paz” e, pelo trecho retirado acima, ficou claro o porquê de Lívia ter se sobressaído no concurso.
Anne, aos 13 anos – mesma idade de Lívia – ganhou seu diário, no qual começou a relatar todos os acontecimentos de sua vida entre junho de 1942 e agosto de 1944. Após o término da guerra, Otto Frank, pai de Anne e único sobrevivente da família, conseguiu retornar à Amsterdã e ter acesso aos diários da filha. Os relatos da garota foram publicados em um livro que se tornou ícone da literatura mundial, uma vez que explora, com ares de ficção, a história real – e aflitiva – de uma família escondida em um cômodo secreto dentro de um prédio comercial.
Lívia recita o texto vencedor em frente à sua escola, sentada na calçada. Seus olhos esbanjam um brilho único, enquanto ela relata que, apesar de não estar inserida na mesma realidade de Anne Frank, ainda é possível enxergar traços semelhantes de discriminação: “É inaceitável pensar que sou melhor ou pior somente por ter nascido negro ou branco, por ter escolhido uma religião ou pertencer a uma tribo”. Ainda, a mineira revela que a sua relação com a família a influenciou na hora de escrever a carta, uma vez que a simplicidade de sua vida seria mal vista por outras pessoas.
Como prêmio por sua colocação no concurso, Lívia ganhou uma viagem à Amsterdã, onde poderá conhecer, ao lado de sua mãe e de seu professor, o Anexo Secreto – local em que Anne ficou escondida antes de ser enviada ao campo de concentração.
Leia, na íntegra, a carta premiada de Lívia:
Belo Horizonte, 3 de abril de 2013
Querida Anne,
Meu nome é Lívia Fernanda, tenho 13 anos, moro no bairro Confisco, Minas Gerais, Brasil. Estudo na Escola Municipal Anne Frank.
Anne, é com muita tristeza que recordo sua história, todo sofrimento nos campos de concentração, o extermínio nas câmaras de gás, a crueldade com que os nazistas tentaram exterminar o povo judeu.
Já não era fácil de entender o modo de pensar de Hitler, mas nos dias de hoje continuamos a pensar e agir como ele, pois o racismo continua nas cidades, no interior e, principalmente, no coração das pessoas.
É inaceitável pensar que sou melhor ou pior somente por ter nascido negro ou branco, por ter escolhido uma religião ou pertencer a uma tribo.
Você não acreditaria que até nas escolas existe preconceito. Mas ele vem disfarçado e o seu nome também é diferente. Não é racismo, ele se chama bullying.
O pior, Anne, é que já existem leis para se combater tanta crueldade. Mas não existe lei que possa colocar amor dentro do ser humano.
Conhecendo a sua história, vejo que há uma luz no fim do túnel. Espero que muitos ouçam-me falar de você. Espero que possam entender que o preconceito não leva a nada, apenas gera violência, separação e divisão.
Você, Anne, pode se orgulhar, pois o seu diário, que foi escrito em meio a tanto sofrimento, hoje serve de referência contra o racismo, contra a discriminação, em todas as suas formas. Seja através do preconceito, bullying e outros, podemos usar como exemplo as suas experiências.
Apesar das dificuldades, assim como você, acredito na esperança.
Abraços, Lívia
Revisado por Iêda Ágnes.
LITERATORTURA
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