Mais
de 60% das mulheres assassinadas no Brasil entre 2001 e 2011 eram
negras. O dado, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), foi
citado pela senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE) ao abrir nesta
quinta-feira (21) debate sobre a violência contra a mulher negra.
Ao longo da discussão, especialistas
na questão destacaram o fato de as mulheres negras, além de terem de
enfrentar situações cotidianas de opressão, ocuparem os lugares mais
desfavoráveis na estrutura social e econômica do país. O evento foi
promovido pela Procuradoria Especial da Mulher do Senado e pela
Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados como parte do programa
Quintas Femininas.
Mônica Oliveira Gomes, que representou
a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir),
destacou os obstáculos no acesso a postos profissionais e à renda
igualitária do trabalho. Ela também mencionou situações de discriminação
até mesmo na utilização dos serviços públicos, a seu ver um problema
que revela a existência de racismo institucional no país, e não apenas o
reconhecido racismo interpessoal.
- A instituição também tem responsabilidade sobre o dano que aquela funcionária ou aquele funcionário venha a causar a quem foi discriminado – defendeu.
A palestrante citou recente estudo do Ipea segundo o qual os negros ganham 36% menos que os brancos, mesmo possuindo a mesma qualificação. Quando se observa apenas a remuneração das mulheres negras, a diferença com os ganhos dos brancos sobe para 40%.
- A instituição também tem responsabilidade sobre o dano que aquela funcionária ou aquele funcionário venha a causar a quem foi discriminado – defendeu.
A palestrante citou recente estudo do Ipea segundo o qual os negros ganham 36% menos que os brancos, mesmo possuindo a mesma qualificação. Quando se observa apenas a remuneração das mulheres negras, a diferença com os ganhos dos brancos sobe para 40%.
Conjunção "perversa"
De acordo com Mônica, as mulheres
negras permanecem na "base da pirâmide", mesmo possuindo mais anos de
estudo e maior qualificação. A seu ver, a discriminação por gênero se
soma ao racismo numa conjunção "perversa", especialmente diante da ideia
geral de que a educação é o caminho para o crescimento e a emancipação
das pessoas.
- No entanto, quanto mais a mulher se qualifica, mais difícil será encontrar uma posição que corresponda ao investimento que fez a vida inteira – lamentou.
Mônica observou que inicialmente o movimento feminista se recusava a discutir a questão racial como um fato específico dentro da questão geral das mulheres, por considerar que isso apenas dividiria a luta. Porém, sem prejuízo da aliança entre as feministas, salientou que agora já se reconhece que a opressão atinge de forma diferente as mulheres negras.
- É impossível alcançar a felicidade convivendo com a discriminação e o sexismo na vida da gente – afirmou.
- No entanto, quanto mais a mulher se qualifica, mais difícil será encontrar uma posição que corresponda ao investimento que fez a vida inteira – lamentou.
Mônica observou que inicialmente o movimento feminista se recusava a discutir a questão racial como um fato específico dentro da questão geral das mulheres, por considerar que isso apenas dividiria a luta. Porém, sem prejuízo da aliança entre as feministas, salientou que agora já se reconhece que a opressão atinge de forma diferente as mulheres negras.
- É impossível alcançar a felicidade convivendo com a discriminação e o sexismo na vida da gente – afirmou.
Discriminação tripla
Na opinião da representante da Seppir,
o termo "violência simbólica" é insuficiente para traduzir situações
vividas pelas mulheres negras que as levam a adoecer, quando não é o
caso de morte. Salientou ainda o que chamou de "tríplice discriminação",
quando se tratam de mulheres negras e também pobres.
Como exemplo, destacou o pior acesso aos serviços públicos de saúde, o que explicaria a maior taxa de óbitos entre as mulheres negras, especialmente a mortalidade materna. Segundo ela, as gestantes negras fazem menos exames pré-natais, essenciais para prevenir causas habituais de morte, como hipertensão, diabetes e problemas cardiovasculares.
Como exemplo, destacou o pior acesso aos serviços públicos de saúde, o que explicaria a maior taxa de óbitos entre as mulheres negras, especialmente a mortalidade materna. Segundo ela, as gestantes negras fazem menos exames pré-natais, essenciais para prevenir causas habituais de morte, como hipertensão, diabetes e problemas cardiovasculares.
Até as consultas feitas seriam mais
curtas, inclusive porque os médicos "preferem não tocar no corpo" das
mulheres negras ou fazem os procedimentos de modo inadequado, ainda de
acordo com Mônica.
Ela explicou, no entanto, que o
racismo institucional ocorre tanto no âmbito dos órgãos públicos quanto
nas instituições privadas. Disse que a discriminação se caracteriza pela
prestação de serviço de forma desigual, por atitude discriminatória de
qualquer dos integrantes da instituição.
Violência doméstica
A pesquisadora do Núcleo de Estudos e
Pesquisas sobre a Mulher (Nepem) da Universidade de Brasília (UnB),
Bruna Cristina Pereira, apresentou dados de estudo que resultou de sua
dissertação de mestrado, intitulada "Tramas e Dramas de Gênero e de Cor –
A violência doméstica e familiar contra as mulheres negras".
O estudo trouxe depoimentos de 14
mulheres negras de diferentes níveis sociais, mostrando que a cor da
pele interfere no relacionamento com o parceiro, com a família e gera
situações de violência.
- Nós temos nos estudos sobre violência doméstica uma discussão sobre o poder disciplinador que seria, na nossa sociedade, patriarcal, essencialmente masculino. E o que eu encontrei foi que esse poder disciplinador nunca está descolado da questão racial, ou seja, o poder disciplinador tem também uma cor, e ela é branca – afirmou.
- Nós temos nos estudos sobre violência doméstica uma discussão sobre o poder disciplinador que seria, na nossa sociedade, patriarcal, essencialmente masculino. E o que eu encontrei foi que esse poder disciplinador nunca está descolado da questão racial, ou seja, o poder disciplinador tem também uma cor, e ela é branca – afirmou.
Bruna exemplificou com o caso de uma
das entrevistadas, identificada como Manoela (nome fictício), que já
sofria discriminação quando ainda morava com os pais, por ser a mais
escura entre as irmãs. Em casa, o pai a obrigava a executar tarefas
domésticas, mas suas irmãs tinham outros deveres. E quando se referia a
Manoela em conversa com a mulher, o pai a chamava de "essa sua
neguinha".
Manoela depois se casou com um homem
mais negro que ela, mas que também a submetia a violências. Ele lhe
dizia que mulheres brancas o desejavam e que tinha um caso com uma
mulher branca.
- Em muitos estudos, o casamento constitui um indicador de que não existe racismo. Isso precisa ser questionado. Não necessariamente porque existe uma relação afetiva, deixa de haver dinâmicas racializadas. Muito pelo contrário, elas podem, inclusive, ser reforçadas – afirmou.
- Em muitos estudos, o casamento constitui um indicador de que não existe racismo. Isso precisa ser questionado. Não necessariamente porque existe uma relação afetiva, deixa de haver dinâmicas racializadas. Muito pelo contrário, elas podem, inclusive, ser reforçadas – afirmou.
A mulher ideal
Segundo a pesquisa de Bruna, há um
modelo da mulher ideal, que não é a mulher negra, mas a mulher branca.
Às mulheres mulatas ou pretas é atribuído um estereótipo de sexualidade
sem virtude.
Bruna citou ainda o caso de Emília
(também fictício), ativista do movimento negro que, em determinado
momento, foi confrontada pelo companheiro com a afirmação de que "sabia
que não deveria ter se casado com uma mulher negra, porque mulheres
negras são vagabundas, são prostitutas".
- Ou seja, não são as mulheres virtuosas – observou Bruna, interpretando a visão expressa pelo homem.
- Ou seja, não são as mulheres virtuosas – observou Bruna, interpretando a visão expressa pelo homem.
Bruna ressaltou ainda um ponto que a
surpreendeu na pesquisa: a visão de que a "virtude" das mulheres pretas,
diferentemente das mulatas, estava sempre relacionada ao trabalho.
Havia, inclusive, parceiros que deixavam de trabalhar para serem
sustentados pelas companheiras ou que as agrediam se elas deixassem de
trabalhar ou se recusassem a sustentá-los.
Para a pesquisadora, o governo e os
militantes contra a violência ainda não foram capazes de criar
instrumentos para perceber e combater o racismo nos relacionamentos.
- Ainda que não se tenham vastos estudos ou vastas ligações entre a violência racial e o maior homicídio das mulheres negras, não tem como pensar que essas formas de violência não estejam conectadas – afirmou.
(Agência Senado) - Ainda que não se tenham vastos estudos ou vastas ligações entre a violência racial e o maior homicídio das mulheres negras, não tem como pensar que essas formas de violência não estejam conectadas – afirmou.
http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=6284&catid=43%2F
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