SÃO PAULO — “O carnaval da Beija-Flor é um insulto para
o povo da Guiné Equatorial” A afirmação é do principal defensor dos
direitos humanos do país, o guinéu-equatoriano Tutu Alicante. Ele diz que 75%
da população de 1,6 milhão de pessoas vivem com apenas dois dólares por dia e
não têm acesso à água limpa ou à saúde. Nada disso foi para a avenida na
madrugada de terça-feira, quando a escola desfilou as “belezas” da Guiné
Equatorial. Alicante é ele mesmo uma das vítimas do regime. Aos 19 anos, a casa
em que vivia com a família foi queimada por forças do governo Obiang. Aos 41
anos, tornou-se o principal crítico internacional do regime, fazendo denúncias
que levaram o ditador a ser investigado nos EUA, na Itália, França e Espanha.
Da sede de sua organização, em Washington, ele falou ao GLOBO por telefone.
O
governo da Guiné Equatorial teria doado R$10 milhões à Beija-Flor. Como o
senhor vê esses rumores?
Isso é um insulto para o
povo da Guiné Equatorial, porque é um dinheiro que o presidente e sua família
roubaram da população. É um governo que trata os recursos naturais do país e o
lucro que vem deles como se fossem dinheiro privado, deles. Esse dinheiro
deveria ir para as coisas mais básicas, como tratamento de água, creches,
hospitais, casas para os mais pobres. Em vez disso, o presidente doa os
recursos para o samba brasileiro. Ele não dá a mínima para o samba, na verdade.
A Beija-Flor foi só mais uma peça de propaganda da ditadura dele.
As
pessoas em Guiné Equatorial já sabem o que aconteceu?
Não há jornais lá. Não existe
imprensa livre na Guiné. As pessoas não sabem o que está acontecendo nem
oficial nem extraoficialmente. Não existe nenhuma rádio ou emissora de
televisão livres. Aliás, a principal emissora pertence ao presidente. As
pessoas da diáspora é que têm postado notícias sobre isso nas redes sociais,
mas os guineenses não têm acesso a isso porque o Facebook é bloqueado, assim
como a maior parte dos sites de informação.
Em contraste com a família do presidente, como
vive um cidadão médio do país?
O presidente Obiang tem pelo menos 17
palácios. O país tem o maior PIB per capita da África, por conta do petróleo.
Mas pelo menos 75% da população não têm onde morar, não estuda, não têm água
limpa. Se ficar doente, morre. Medicamentos mais básicos, como os de malária,
são inacessíveis. E as epidemias, constantes. Eles vivem de refeição em
refeição. A cada dia precisam lutar para conseguir os dois dólares com os quais
poderão comer no dia seguinte, e assim sucessivamente. Há uma única
universidade no país, a Universidade Nacional, em que não há alunos porque os
prédios não têm eletricidade, não há livros nem recursos para fazer a
universidade funcionar.
Quais
as violações aos direitos humanos que acontecem hoje?
Enquanto conversamos agora
há alguém sendo torturado na Guiné Equatorial. Não sabemos quantas vítimas em
35 anos. Mas nos últimos dois ou três anos, pelo menos 60 mil pessoas foram
sequestradas, executadas ou torturadas. Todo dia alguém tem seus direitos
violados, sobretudo nas prisões. E o país mantém a pena de morte, contrariando
promessa que fez aos países de língua portuguesa. A pena de morte pode ser
imposta a qualquer um que cometa um crime capital. O tribunal de Justiça também
está sob jugo de Obiang, então, no limite, morre quem ele decidir que deve
morrer.
Como
a família Obiang opera seus esquemas de corrupção?
Todos os membros da família
Obiang ocupam cargos no governo: filhos e filhas, sobrinhos e sobrinhas,
cunhados e cunhadas. É um sistema nepotista de lavagem de dinheiro. Os casos
mais notórios envolvem o confisco de uma mansão em Malibu, avaliada em US$ 100
milhões. Essa mansão teria sido comprada com o dinheiro depositado por empresas
que exploram os recursos do petróleo em uma conta do Tesouro Nacional da Guiné
Equatorial. O presidente, seu filho Teodorín e um sobrinho fizeram depósitos da
conta do Tesouro para suas contas bancárias pessoais. Cada membro da família
possui uma empresa. São quase todas de fachada. Mas são elas que prestam
serviços para o governo.
Onde
a família possui bens?
Eles têm mansões nos EUA,
navios no Panamá, recentemente tentaram comprar o iate mais caro do mundo, na
Alemanha. Além disso, possuem propriedades em Cingapura, França, Espanha,
China, África do Sul, Marrocos e algumas no Brasil.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/carnaval/2015/e-um-dinheiro-que-presidente-sua-familia-roubaram-do-povo-diz-vitima-de-ditador-15387195#ixzz3SIbKSjN1
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