Um grupo de torcedores brasileiros
surpreendeu crianças com câncer de um hospital público em Samara, na Rússia, na
véspera do jogo da seleção nas oitavas de final da Copa do Mundo.
Às 9h, enquanto as crianças recebiam
medicamentos e passavam por sessões de quimioterapia, o grupo apareceu
caracterizado como "doutores da alegria" vestidos de verde e amarelo.
Eles trouxeram um saco de presentes – de óculos de palhaço a balões e bandeiras
do Brasil.
Repetindo o gesto da torcida nos
estádios, de gritar os nomes dos jogadores escalados para os jogos da Copa, os
pequenos russos internados no "Hospital Infantil 1" também tiveram
seus nomes gritados pelos brasileiros.
"Dimitri! Dimitri! Dimitri"
"Ivan! Ivan! Ivan!"
"Olga! Olga! Olga!"
Os que conseguiam se levantar foram
acompanhar a trupe nos corredores do hospital e chegaram a jogar futebol com os
brasileiros com balões infláveis.
Os demais receberam visitas e ganharam presentes nos próprios
quartos.
"O mais marcante foi um menino
com os movimentos bem limitados que tocou pandeiro para os brasileiros
sambarem. Deu pra ver que ele achou o máximo os próprios movimentos terem
criado um ritmo para as pessoas dançarem", disse a brasileira Ohana Berger,
que estuda em Samara e atuou como tradutora voluntária entre os torcedores e os
pacientes, médicos e familiares.
"Me fez pensar em como, às
vezes, uma coisa besta para a gente é motivo de alegria para um menino como
aquele."
'Patch Adams'
Por duas horas, os pequenos se
fantasiaram com os mesmos apetrechos que os torcedores usam nas arquibancadas.
A surpresa foi divulgada, em russo,
pela Prefeitura de Samara. A imprensa local descreveu a visita como uma
"festa para as crianças".
O grupo, formado por médicos,
empresários, estudantes e jornalistas, inicialmente resistiu a conversar com a
BBC News Brasil.
"Isso não é marketing. Fizemos
de coração. Não queremos que isso seja percebido como oportunismo porque não é
e nunca quisemos divulgar. Você que nos achou. Nós fizemos com amor", diz
o mastologista paulista Fernando Pontes, após concordar em receber a
reportagem.
Antes da surpresa em Samara, o mesmo
grupo tentou fazer visitas a hospitais em Moscou e São Petersburgo, mas não
obteve autorização das instituições.
O médico explica a motivação:
"Desde que resolvi fazer medicina, meu principal ícone e exemplo é o Patch
Adams. Fui a palestras dele em pessoa, cheguei a conhecê-lo", conta
Pontes, que criou o grupo "Torcedores da Alegria" em 2008, junto a
amigos.
Hoje com 73 anos, Adams ficou
mundialmente famoso após ser interpretado pelo ator Robin Williams em filme
homônimo. O americano defende que medicina e alegria devem caminhar de mãos
dadas.
"Queríamos levar a energia e a
positividade do estádio para quem não tem condições de estar no campo porque
está doente", resume o mastologista.
'Primeira coisa do tipo no hospital'
Para outro dos torcedores-palhaços, a
iniciativa funcionou como "um banho de cachoeira".
"De ambos os lados. Nós lavamos
a alma. Perguntamos a uma das crianças se ela gostava de futebol e ela
respondeu: 'sim, torço para o Brasil'", diz o publicitário José Ricardo
Mannis.
"No começo elas estavam
ressabiadas. Não estavam acostumadas. Depois se soltaram, jogaram bola com
bexiga, teve gente que se emocionou, chorou, a reação foi muito linda",
completa o empresário Bruno Zangari.
"Eu estudo isso e sei que a
risada e a energia positiva ajudam na recuperação. Os estudos provam que o alto
astral traz imunidade e recuperação. Quando saímos, as crianças estavam com
outro semblante", diz o médico Pontes.
A reação das crianças contaminou
pediatras e oncologistas do hospital, que aceita doações para manter suas
atividades.
"Todos os médicos ficaram
encantados e disseram que foi a primeira coisa do tipo que aconteceu neste
hospital", diz a tradutora voluntária Ohana Berger. "E todas as
crianças disseram que, além da Rússia, torciam para o Brasil."
A tradutora voluntária não vai
esquecer o episódio tão cedo.
"Um momento que também me marcou
foi quando a enfermeira disse: 'Quem puder, pode dançar com eles!'. Nem todas
as crianças foram. Algumas só mexeram os braços do lugar de onde estavam
sentadas, porque não conseguiam fazer movimentos muito abertos", lembra a
estudante.
Os organizadores da visita também
fazem parte do Movimento Verde Amarelo, que acompanha a seleção e equipes do
Brasil de outros esportes para reunir a torcida brasileira em eventos
internacionais.
"A gente não vai colocar isso
nas nossas redes sociais, nunca quisemos nos promover com isso. Por favor, é
muito importante que isso fique claro, a ação não tem a ver com promoção",
diz Zangari.
https://g1.globo.com/mundo/noticia/torcedores-brasileiros-visitam-criancas-com-cancer-e-transformam-hospital-na-russia-em-arquibancada-da-copa.ghtml
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