Completam-se nesta quinta, 15, 20 anos da morte de Greta Garbo. Na verdade, Greta Louise Gustafsson desaparecera quase 50 anos antes, quando Garbo, após interpretar o que seria seu último filme - Duas Vezes Meu, de George Cukor, em 1941 -, resolveu radicalizar a própria divisa famosa ("I want to be alone"/Quero ficar sozinha) e abandonou não apenas o cinema, mas o próprio convívio social. Isso ocorreu quando tinha 36 anos. Nas décadas seguintes, e até sua morte, qual misantropa, ela viveu reclusa em seu apartamento da Rua East 52, em Nova York, escondida por trás de chapelões e óculos escuros, sempre fugindo dos fotógrafos que davam plantão em busca de um flagrante raro.
Nesse período, nunca faltaram diretores dispostos a lhe oferecer o grande papel para o seu retorno. Luchino Visconti foi um deles. Durante anos ele sonhou com sua adaptação do romance Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust, reservando para Garbo o papel da Rainha de Nápoles, mas estava escrito que ela não aceitaria (e que o filme nunca seria feito). Divina Garbo. Ela foi, talvez, o mito mais misterioso criado por Hollywood e permanece como o mais indestrutível. Livros e filmes tentaram explicar o segredo dessa permanência. A data - os 20 anos de morte - serão lembrados hoje pelo TCM, que programou cinco filmes interpretados pela estrela. O maior deles é Rainha Cristina, de Rouben Mamoulián, mas outros dois foram essenciais na construção do mito - A Dama das Camélias, de George Cukor, e Ninotchka, de Ernst Lubitsch, todos dos anos 1930.
Críticos até hoje discutem se Garbo era mesmo uma atriz. Sem dúvida que ela mostrou que sabia representar - e nunca foi mais impressionante do que na morte de Marguerite Gauthier, a dama das camélias. Mas o momento sublime de Garbo no cinema é o plano sequência de Rainha Cristina, no desfecho do filme de Mamoulián - Cristina abdicou do trono da Suécia e está partindo. Ela se posiciona na proa do navio e a câmera descreve um lento movimento rumo ao seu rosto. Garbo fica imóvel, sem mover um músculo, olhando o que parece o horizonte distante. Não existe uma linha de diálogo, um piscar de olhos. Uma estátua de mármore. A imagem é emblemática - o espectador pode ler tudo naquele rosto que não expressa nada.
Leituras. Era o mistério de Garbo, segundo os semiólogos. Acima de tudo, ela foi um rosto - aquele rosto -, que se prestava a todas as leituras. Mas Garbo somava àquele mistério a voz e, certamente, quando necessário, sabia como se movimentar em cena. Sua imagem era tão associada ao drama que, quando surgiu Ninotchka, em 1939, a empresa produtora Metro centrou a publicidade do filme numa frase - ‘Garbo ri’.
A comédia clássica de Lubitsch é sobre agente comunista que descobre em Paris as delícias do capitalismo, isto é, champanhe. Garbo tem uma cena antológica com Ina Claire, mas conta a lenda que ela, fazendo a mímica do riso, não conseguia emitir o som. O riso teve de ser providenciado depois. Quando Garbo morreu, Federico Fellini não deixou por menos. Disse que ela foi a fundadora de uma nova ordem religiosa, chamada cinema.
Fonte: O Estadão
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é muito importante para nós. Deixe-o aqui e participe desse universo onde a opinião de cada um tem o poder de fazer as coisas ficarem sempre melhores.